terça-feira, 27 de novembro de 2012

Lupcínio Rodrigues

(Porto Alegre/RS, 16 de setembro de 1914 — Porto Alegre/RS, 27 de agosto de 1974)

Nasceu em Porto Alegre, capital do Rio Grande do Sul, em 16.9.1914, na Travessa Batista nº 97, na Ilhota, bairro pobre da Cidade Baixa. Chovia muito e, com a inundação, a parteira teve de ir atender D. Abigail de barco. Foi o quarto, e primeiro homem, de 21 filhos, de uma família extremamente musical. Seu pai, Francisco Rodrigues (seu Chico), era porteiro da escola de Comércio. Por coincidência, faleceria em outro dia chuvoso, em 27.8.1974, na mesma cidade de sua eterna ternura, Porto Alegre.

Com 6 anos de idade, seria matriculado na Escola Complementar, estudando a seguir nas escolas Ganzo e Dom Sebastião. Era um aluno de atenção muito distraída para a música e para o futebol.

Depois do primário, faz o curso de mecânica na Escola Técnica Parobé, sendo admitido como aprendiz na companhia de bondes e, depois como menino de recados na fábrica Micheletto. Em 1928, com 14 anos, compõe a marchinha Carnaval para o Cordão Prediletos. Na esperança de afastá-lo de uma vida boêmia que precocemente já adota - bebida, mulheres e música - seu Chico o obriga a se alistar "voluntariamente" no Exército, com 16 anos incompletos. De fato entraria na linha, mas quando marchava com seus camaradas de farda.

Quando é transferido, em 1933, para Santa Maria, interior rio-grandense, conhece sua musa inspiradora, Inah, uma paixão que deixaria em seu coração cicatrizes pelo resto da vida, uma dor de cotovelo que definiria como "federal". Para ela ou por causa dela, compôe Felicidade, Zé Ponte e Nervos de Aço, esta em 1938, já na volta para Porto Alegre, onde o noivado teria fim.

Vem conhecer, em 1932, ainda em Porto Alegre, Noel Rosa, que fazia uma excursão pelo Sul com Francisco Alves e Mário Reis. Depois de ouvir-lhe algumas músicas, Noel Rosa não hesita em dar sua opinião sobre aquele rapaz de apenas 17 anos. Profetiza: "Este garoto é bom! Este garoto vai longe!"

Mais ou menos nessa ocasião, chegava ao 7º Batalhão de Caçadores, unidade de elite, onde Lupicínio estava engajado, um catarinense de boa voz, Nuno Roland. Lupicínio, que tinha em Mário Reis seu espelho de cantor, e era o "crooner" do Jazz do batalhão, com alívio passa a missão ao novo soldado, imediatamente seu amigo nas madrugadas. Quando estoura a Revolução Paulista de 1932, o 7º B.C. é mandado para São Paulo, onde desembarca com Lupicínio e Nuno. Durante a longa viagem de trem, foram eles disparando muitos sambas. Nuno faria brilhante carreira no rádio e no disco.

Deixa a caserna em 1935. Nesse ano, em parceria com Alvides Gonçalves, compõe e inscreve Triste História no concurso que se realizava em Porto Alegre, dentro das comemorações do Centenário da Revolução Farroupilha. Conquistam o primeiro prêmio de 2 contos de réis.

Mesmo já tenho inúmeras músicas prontas, Lupicínio não se empenhava em divulgá-las, só realizando sua primeira gravação em 1936, e sem que precisasse sair de Porto Alegre, porque Alcides viaja para o Rio de Janeiro e, na R.C.A. Victor, grava dois sambas de ambos: Pergunta a Meus Tamancos e o Triste História. Só depois de dois anos, em 1938, estabelece uma ponte com Felisberto Martins, compositor, pianista e funcionário de gravadora no Rio, que ainda não conhecia pessoalmente, para que se encarregasse da divulgação de suas músicas em troca de parceria. Foi bom para os dois.

De 1935 a 1947, por interferência do pai, trabalha como bedel da Faculdade de Direito. De Porto Alegre nunca se afastaria, a não ser por uns meses em 1939, mais para conhecer o ambiente musical carioca. Porto Alegre era seu berço querido e todo o seu universo. Mesmo assim pôde ser cumprida a predição de Noel: "foi longe". Suas músicas, "qual ponta-de-lança", foram bater em todos os pontos do Brasil e até no exterior. Era procurado por cantores em busca de sucesso e de Porto Alegre fez a Capital do Samba Canção.

A imagem do boêmio teve o contraponto do proprietário, que foi, de diversos bares, churrascarias e restaurantes com música, que seguidamente ia abrindo e fechando, como o Jardim da Saudade, o Clube dos Cozinheiros e, o mais célebre de todos, o Batelão, que elevou a ponto turístico da cidade. Tudo apenas para ter, antes do lucro, um local para encontro com os amigos. Gabava-se de ser mais cozinheiro que compositor, especializado no trivial caprichado.

Exerceria, por muitos anos, o corgo de procurador do SDDA (Serviço de Defesa do Direito Autoral) e de representante da SBACEM (Sociedade Brasileira de Autores, Compositores e Escritores de Músicas). Alma boa e caridosa, manteve, em propriedade sua, um abrigo para desprotegidos da sorte, nenhum alarde fazendo.

Sua rotina dividia-se entre a boemia e o lar, onde primava em ser um perfeito chefe de família. No seu casamento com D. Cerenita, apesar dessa inusitada combinação, reinava o amor. Seu samba Exemplo, é de um profundo afeto: "Quando eu chego cansado/teus braços estão me esperando..."

Suas músicas nasciam de fatos reais, observados ou vivenciados. "Cada uma que me faz uma sujeira, me deixa inspiração para compor algo. Meu primeiro automóvel foi comprado com o dinheiro de um samba, feito para uma mulher... Minha casa foi adquirida com o dinheiro de um samba que fiz para outra, também por causa de uma traição..."

"Temperamento calmo, pessoa modesta, meio desligado, passo lento, voz macia, ombro caindo para a direita, sem a barbicha que o caracterizava, Lupicínio parece não ver o tempo passar. Ele, sim, vai passando pelo tempo, indiferente, olhando a vida à sua moda..."

Foi o inventor do termo "dor-de-cotovelo". Este termo, ao contrário do que se propagou como inveja - se refere à prática, comum nos bares, do homem ou mulher que se senta no balcão, crava os cotovelos no mesmo, pede um Whisky duplo, faz bolinhas com o fundo do copo e chora o amor que perdeu.

Lupe, como era chamado desde pequeno, tinha três grandes paixões em sua vida: a música, o bar e as mulheres. A música poderia ter convivido com tranqüilidade com as outras duas, mas as mulheres em sua vida jamais entenderam ou conviveram com sua paixão pela boemia.

Constantemente abandonado, Lupicínio buscava em sua própria vida a inspiração para suas canções, onde a traição e o amor andavam abraçados, afogando as mágoas na mesa de um bar - onde, finalmente, conseguia unir suas paixões: amor, música e boemia. Com versos profundos, conseguia tocar todos os corações que paravam para ouvi-lo, dando, a cada um, a sua própria história.

Ninguém soube, como ele, cantar a dor e a desilusão de forma tão genial, sem cair em clichês e lugares comuns. Todas as pessoas que um dia choraram um amor, ergueram sem dúvida um brinde a Lupicínio.

De 1935 a 1947, trabalhou como bedel da Faculdade de Direito da UFRGS. Nunca saiu de Porto Alegre, a não ser por uns meses em 1939, para conhecer o ambiente musical carioca. Porto Alegre era seu berço querido e todo o seu universo.

Boêmio, foi proprietário de diversos bares, churrascarias e restaurantes com música, que seguidamente ia abrindo e fechando, tudo apenas para ter, antes do lucro, um local para encontro com os amigos.

Torcedor do Grêmio, compôs o hino do tricolor, em 1953: "Até a pé nós iremos / para que der e vier / Mas o certo é que nós estaremos / com o Grêmio onde o Grêmio estiver". Seu retrato está na Galeria dos Gremistas Imortais, no salão nobre do clube.

Mas o tempo implacável cedo o veio buscar do convívio familiar, dos amigos e admiradores, ficando porém sua obra como um legado para os que sentem que, apesar dos riscos, vale a pena amar demais, venham as dores de cotovelo que vierem. Enquanto houver paixão, Lupicínio viverá e será amado.

Deixou cerca de uma centena e meia de canções editadas; outras centenas que compôs foram perdidas, esquecidas ou estão à espera de quem as resgate.

OBRAS:

Aves daninhas
Cadeira vazia
Cevando o amrgo
Ela disse-me assim
Esses moços, pobres moços
Exemplo
Felicidade
Foi assim
Judiaria
Loucura
Maria Rosa
Nervos de Aço
Nunca
Quem há de dizer
Se acaso você chegasse
Se é verdade
Sozinha
Torre de Babel
Um favor
Vingança
Volta
Zé Ponte 

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