terça-feira, 27 de novembro de 2012

Noite Ilustrada

(Pirapetinga/MG, 10/04/1928 ******* Atibaia/SP, 28/07/2003)

O cantor Mário de Souza Marques Filho, conhecido como Noite Ilustrada, nasceu na cidade de Pirapetinga, Minas Gerais, em 10 de abril de 1928.

Ainda criança, na cidade de Porto Novo do Cunha (atualmente Além Paraíba), engraxava sapatos e carregava leite para ajudar a mãe, separada há poucos anos. O pai, que estava morando no Rio de Janeiro, mandou buscá-lo e, na impossibilidade de oferecer uma melhor assistência ao pequeno Mario, matriculou-o em um internato do Serviço de Assistência aos Menores e posteriormente no Instituto Profissional Getúlio Vargas.

Assim, Mário Filho viveu a infância e adolescência em colégios internos. Aprendeu a enfrentar os percalços da vida sozinho - já que a presença familiar era um luxo que ele tivera poucas vezes, quando o pai ou a mãe iam visitá-lo em algum domingo. Dentro do ambiente escolar, cresceu cercado pela música e pelo futebol. Era lateral esquerdo. A decisão entre a prática esportiva e a musical deu-se após um problema que vitimou seu joelho. O futebol acabou ficando em segundo plano no coração botafoguense e a música passou a ocupar as horas vagas do garoto junto com os colegas do internato.

Saindo do Instituto Getúlio Vargas, além da formação escolar, o rapaz aprendeu a trabalhar com móveis. Nesse ofício, no bairro de Vila Isabel, conheceu outros músicos que residiam na Mangueira e costumavam realizar rodas de samba. Ele começou a freqüentar esses encontros ocasionalmente, apenas pela diversão. Porém, anos depois se viu integrado ao grupo de sambistas da Portela. Nele, começou a fazer apresentações em outros estados. Numa dessas oportunidades, em meados da década de 50, em São Paulo, Mario Filho decidiu dar um rumo à sua carreira e estabeleceu-se na capital paulista, onde ficou conhecido nacionalmente.

Embora São Paulo tenha o papel de cidade que acolheu e revelou Noite Ilustrada, sua carreira deu seus frutos iniciais ainda no Rio de Janeiro. O primeiro deles veio com o nome carregado pelo artista até o fim de seus dias. Durante um período de férias, ele foi convidado a participar da caravana do comediante Zé Trindade como violonista. Em um dos shows realizados no estado de Minas Gerais, o organizador resolveu colocar Mário Filho para cantar. No momento de anunciá-lo, Zé Trindade esqueceu como deveria apresentar sua nova atração e, lembrando-se do nome de uma revista que o rapaz sempre carregava no bolso, chamou-o de "Noite Ilustrada".

A princípio ele não gostou do apelido, mas de tanto ser chamado assim, acabou incorporando o nome artístico. Intérprete singular, gravou o primeiro trabalho, como profissional, ainda nos anos 50. O compacto, em 78 rotações, lançado pela Discos Mocambo (selo da gravadora pernambucana Rosemblit, que mais tarde se transformaria na Top Tape), tinha uma música de cada lado: “Cara de Boboca”, de Jaime Silva e Edmundo Andrade, e “Castiguei”, de Jorge Costa e Venâncio. O ano era 1958 e junto com o contrato para integrar a Mocambo, Noite Ilustrada recebeu um convite para fazer parte do elenco da Rádio Nacional, uma das mais importantes emissoras do país.

Posteriormente, foi contratado pela Philips. Nela gravou, em 1962, o segundo compacto com duas músicas. Uma de sua autoria, “Lua Triste”, e outra do zoólogo Paulo Vanzolini, “Volta Por Cima”, que se transformou em sucesso nacional, marcando profundamente a vida artística de Noite Ilustrada. Esta contradição acabou tornando-se constante em sua carreira. Ele é mais conhecido como intérprete do que como compositor. Na sua voz, canções de Ataulfo Alves (“Leva Meu Samba”, “Laranja Madura”, “Sei Que É Covardia”, “Pois É”), Dorival Caymmi (“Maracangalha”, “Saudade da Bahia”), Cartola (“As Rosas Não Falam”, “Sim”, “Amor Proibido”), Nelson do Cavaquinho (“Palhaço”, “Degraus da Vida”), Noel Rosa (“O Neguinho e a Senhorita”) e outros grandes nomes da música popular brasileira ganharam interpretações tão marcantes que acabaram vinculadas ao nome do cantor.

Um aspecto interessante da relação de Mário de Souza Marques Filho com sua trajetória artística é que ele separava o cantor do compositor, como se fossem duas personas. Noite Ilustrada era o intérprete e Marques Filho (adotando o sobrenome paterno), o compositor. Nos discos em que aparecem músicas de sua autoria, estas vêm assinadas como Marques Filho, mesmo que na capa esteja estampado Noite Ilustrada.

Entre os anos 70 e 80, o samba perdeu espaço no mercado fonográfico brasileiro. Noite Ilustrada começou a enfrentar dificuldades para gravar discos e fazer shows, e as apresentações noturnas, que garantiam boa parte da sua sustentabilidade financeira, começaram a rarear. Ele, então, fez um concurso para motorista de caminhão de lixo. Passou, mas não assumiu o cargo. Preferiu juntar as economias e investir em apresentações, na tentativa de conseguir algum retorno.

Em uma entrevista ao programa Top Set, da TV Tupi, Noite Ilustrada conta que por volta de 1984, com o falecimento de Altemar Dutra, o empresário do cantor começou a procurar outro artista para trabalhar. Ele, então, foi convidado para uma temporada de três meses em Recife. O começo foi sofrido, ele passou sérias dificuldades, porém conseguiu firmar-se e a cidade serviu como uma espécie de catapulta para uma carreira que já mostrava sinais de estagnação. A empatia com a capital pernambucana foi tão grande que o artista acabou permanecendo até 1996.

No Nordeste, ele integrou o cast da gravadora Polydisc e lançou as coletâneas Cada Vez Melhor e Aplauso do Povo. A primeira serviu para alavancar a carreira de Noite Ilustrada no Norte e Nordeste. Ele vendeu mais de trezentas mil cópias deste disco fora dos mercados das grandes capitais. A segunda é quase desconhecida. Nunca é citada na discografia oficial, mas possui pérolas como “Ai, que Saudade de Amélia”, parceria de Ataulfo Alves com o falecido ator-compositor Mario Lago; “Ainda É Tempo”, de Flavinho da Portela (considerado por Noite Ilustrada um compositor excelente) e Fernando Paes; uma composição própria em parceria com Antonio Mota, chamada “Andorinha”, que abre o pout-porri do disco; além de uma canção de Getúlio Cavalcanti intitulada “Por Amor a Recife”.

Noite Ilustrada esteve em Recife em 2003, durante o Festival Nacional da Seresta, realizado no Marco Zero. Para o espectador, a apresentação foi um misto de êxtase e dor. Êxtase por estar novamente diante de um artista que valorizou, em suas interpretações, os maiores nomes da música popular nacional. Dor, por ver suas feições debilitadas e perceber que aquela era uma das últimas, senão a última, oportunidade de apreciar a voz do mestre mineiro ao vivo. A apresentação, naquela noite estrelada com o Atlântico ao fundo, acabou sendo o derradeiro encontro do sambista com a Veneza Brasileira.

A última obra do cantor saiu pela Trama, em 2001, sob o título de Perfil de Um Sambista. A música-título composta por Adauto Santos, especialmente para homenageá-lo, caiu como uma luva em sua trajetória. É um bom resumo do que foi o meio século de carreira de Noite Ilustrada. O restante do disco é composto por sucessos antigos que ganharam novos arranjos, a exemplo de “Volta Por Cima”, e por mais três canções inéditas: “Beco Sem Saída”, de Silvio Caldas, “Meus Vinte Anos”, de Wilson Batista e Silvio Caldas, e “A Primeira Escola”, de Pereira Matos e Joel de Almeida.

Noite Ilustrada tinha planos de lançar um disco inteiro com novas canções. Pouco antes de falecer, fez parceria com Cássia Eller na faixa “Você Passa, Eu Acho Graça”, que foi lançada ano passado, em um álbum póstumo da cantora chamado Participação Especial. Ele também soltou a voz em projetos que faziam uma releitura da obra de dois compositores que admirava em demasia: Ataulfo Alves e Lupicínio Rodrigues.

"Ao Mestre Com Carinho", lançado em 2003 pela gravadora independente Atração, traz sete composições de Ataulfo Alves, que considerava Noite Ilustrada seu sucessor. O álbum "Noite Ilustrada Canta Lupicínio Rodrigues" era um sonho que o sambista cultivava de lançar um disco exclusivo com músicas do gaúcho que compôs “Nervos de Aço”, já interpretada por Noite na série Popularidade, lançada pela Warner.

A discografia completa de Noite Ilustrada possui mais de quarenta álbuns, entre composições inéditas e muitas coletâneas. Uma boa referência para o trabalho dele são estas obras que figuram na maioria dos inventários da trajetória musical do artista.

Perfil de um Sambista (Trama - 2001)
Volta à Gafieira (Coletânea – Atração - 2000)
Eu Sou o Samba (Camerati - 1998)
Aplauso do Povo (Polydisc -1987)
Cada Vez Melhor (Polydisc -1986)
A Profecia (Fermata - 1982)
O Fino do Samba – Vol. 2 (Cristal/WEA - 1981)
À Vontade (Continental - 1979)
Não Me Deixe Só (Continental - 1978)
Noite Ilustrada (Tapecar -1976)
Noite Ilustrada (Tapecar -1975)
Samba Sem Hora Marcada (Continental - 1974)
Noite Ilustrada Interpreta Marques Filho (Continental - 1972)
Samba É Comigo Mesmo (Continental - 1972)
Noite Ilustrada (Continental - 1971)
Samba Sem Problemas (Continental - 1970)
Papo Furado – Isaura Garcia e Noite Ilustrada (Continental - 1970)
Noite Ilustrada (Continental - 1969)
Revivendo o Mestre Ataulfo (Continental - 1969)
Depois do Carnaval (Odeon - 1966)
Caminhando (Philips - 1965)
Noite no Rio (Philips - 1964)
Noite Ilustrada (Philips - 1963)
O Ilustre (Philips - 1962).


Noite Ilustrada morreu no dia 28 de julho de 2003, em Atibaia, no interior do Estado de São Paulo, aos 75 anos. Ele estava internado desde o dia 27 de junho, no Hospital Novo Atibaia, fazendo tratamento contra um câncer no pulmão. O corpo do cantor foi velado na Câmara Municipal de Atibaia. O enterro aconteceu no cemitério Parque das Flores.

Fontes: Sites Rabisco, Folha Online, Portal Afro, Imusica, Terra

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