terça-feira, 27 de novembro de 2012

Tonico

(São Manuel/SP, 2 de março de 1917 ****** São Paulo/SP, 13 de agosto de 1994)


Nascido João Salvador Perez, Tonico era filho do casal Salvador Perez e Maria do Carmo Perez.. Junto com seu irmão Tinoco (José Perez) formou a dupla de maior longevidade na canção sertaneja do Brasil.

A inclinação para a música veio a partir dos avós maternos, Olegário e Izabel, que costumavam alegrar a colônia com suas canções, tocadas em uma sanfona. Em 1925 aprendeu a primeira música, “Tristeza do Jeca” e, dez anos depois fez ao lado do irmão Tinoco, a primeira apresentação profissional. A apresentação foi em uma quermesse, na festa da Aparecidinha em São Manuel. Tonico e Tinoco juntaram-se ao primo Miguel e formaram o “Trio da Roça”.

Em 1930, quando a família Perez trabalhava na fazenda Tavares, em Botucatu, os dois irmãos ouviram discos da série caipira de Cornélio Pires. João frequentava a escola rural e dava lições para os colonos mais velhos.Dos amigos cobrava um litro de querosene por mês (para manter os lampiões da sala de aula), mas dificilmente recebia alguma ajuda.

Em 1931, Tonico e Tinoco moravam em Botucatu (SP), na fazenda Vargem Grande, de Petraca Bacci, com os pais, Salvador Perez - um espanhol de Léon, na Astúrias espanhola, chegado ao Brasil criança, em 1892 e Maria do Carmo, uma brasileira descendente de negros com bugres. A exemplo de outras crianças da época, os dois garotos, mal aprenderam a falar, já eram cantadores das modas de viola. Aprendiam as letras com Virgílio de Souza, violeiro das redondezas.

Era muito comum à época os bailes de São João nos quais as moças vestiam seus melhores vestidos de chita e os rapazes suas camisas quadriculadas. A esperança dos moços e das moças era arrumar um namoro. Foi num desses bailes que Tonico conheceu e apaixonou-se por Zula, filha do administrador da fazenda, Antônio Vani. O pai proibiu o namoro e magoado, Tonico compôs Cabocla.

Ao lado do irmão Tonico cantava nas horas livres e folgas do trabalho as modas de viola de Jorginho do Sertão, um autor imaginário, que utilizavam para assinar suas canções, que falava da crise no país com as revoluções de 1930 e 1932.
No fim do ano agrícola de 1937, os Pérez decidiram, com outras famílias, tentar a vida na cidade de Sorocaba (SP). As irmãs Antonia, Rosalina e Aparecida foram trabalhar na fábrica de tecidos Santa Maria. Tonico foi ser servente na Pedreira Santa Helena, fábrica do cimento Votorantim. Tinoco virou engraxate na Estação Sorocabana e Chiquinho engajou-se na construção da Rodovia Raposo Tavares, que liga o sul de São Paulo ao Mato Grosso do Sul. A crise econômica do país chega ao auge. Getúlio Vargas implanta a ditadura do Estado Novo. Adolf Hitler invade e ocupa a Tchecoslováquia e depois a Polônia. Começa a Segunda Guerra Mundial.

A vida em Sorocaba ficou insuportável, nada dá certo para os Pérez e eles decidiram retornar ao campo, agora para a fazenda São João Sintra, em São Manoel (SP). A volta, contudo, possibilitou aos irmãos Perez a primeira chance de cantar numa Rádio. O administrador da fazenda, José Augusto Barros, levou-os para cantar na Rádio Clube de São Manoel - ainda hoje lá, na rua Coronel Rodrigues Alves, no centro da cidade. Assim, até o final de 1940, eles ficaram trabalhando na roça durante a semana e aos domingos cantavam na emissora da cidade. Só por amor à arte, sem ganhar. As dificuldades levaram os Pérez a uma derradeira migração.

Em janeiro de 1941 chegaram, de mala e cuia - quatro sacos com os trens de cozinha e duas trouxas de roupa - a São Paulo. Por falta de profissão, as meninas foram trabalhar em casa de família, Tinoco num depósito de ferro-velho, o irmão Chiquinho na metalúrgica São Nicolau e Tonico, sem outra alternativa, comprou uma enxada e foi ser diarista nas chácaras do bairro de Santo Amaro. Os tempos duros da cidade grande tinham lá sua compensação, principalmente nos domingos, quando a família ia ao circo, na rua Lins de Vasconcelos no então pacato bairro do Cambuci. Num desses espetáculos, os manos conheceram pessoalmente Raul Torres e Florêncio, a dupla de violeiros mais famosa de São Paulo e que depois,com Rielli na sanfona, formaram na Rádio Record o famoso trio "Os Três Batutas do Sertão". A Rádio Record era do doutor Paulo Machado de Carvalho, que seria chamado "Marechal da Vitória" quando chefiou as seleções brasileiras de futebol campeãs do mundo em 1958 e 19ó2. Depois conheceram Teddy Vieira - um paulista de Itapetininga que produziu um formidável acervo de 500 músicas sertanejas da melhor qualidade - Palmeira e Piraci, artistas exclusivos da Rádio Difusora, no programa "Arraial da Curva Torta", Zé Carreiro e Carreirinho,os quais surgiram em 1950, por intermédio de Tonico e Tinoco que queriam gravar a moda "Canoeiro" deles e os quatro fizeram um acordo: deixariam Tonico e Tinoco gravar a moda se os mesmos arrumassem um contrato na gravadora para eles gravarem também.

Em São Paulo, inscreveram-se no programa de calouros comandado por Chico Carretel (Durvalino Peluzo), na Rádio Emissora de Piratininga. O capitão Furtado, que estava sem violeiro em seu programa Arraial da Curva Torta, na Rádio Difusora, promoveu então concurso para preencher a vaga: os dois irmãos, formando a dupla "Irmãos Perez", cantaram o cateretê "Tudo tem no sertão" (Tonico). Classificados para a final, interpretaram de Raul Torres e Cornélio Pires, (esse último um radialista e pesquisador que foi pioneiro no estudo da vida sertaneja, especialmente a paulista, e que deixou uma extensa obra a respeito.) "Adeus Campina da Serra". Quando terminaram, o auditório aplaudiu de pé, em meio a lágrimas. Todos pediam bis àquela dupla que cantava diferente, com afinação, fino e alto. Todos os outros violeiros foram abraçá-los. O cronômetro marcava 190 segundos de aplausos, contra apenas 90 segundos da dupla segundo colocada. Outra citação importante é que tomaram parte desse concurso junto com os Irmãos Perez, duplas profissionais, conhecidas do Rádio como Nhô Nardo e Cunha Junior, Serra Morena e Cafezal, mas o primeiro lugar estava reservado para nossa querida dupla.

No dia seguinte o Trio da Roça estava contratado pela Rádio Difusora, que naquele período havia sido comprada pela Tupi, parte de ofensiva do jornalista Assis Chateaubriand para formar uma poderosa rede de veículos de comunicação - os Diários e Emissoras Associados. Três meses depois o contrato foi renovado por dois anos e o salário foi acertado em cruzeiros, a nova moeda que aposentara os réis. Eram 1.200,00 uma fortuna, comparado ao salário mínimo, da época, de 280,00. Já sem o primo Miguel, eles eram apenas os irmãos Pérez. Um dia, durante um ensaio do programa Arraial da Curva Torta, o Capitão Furtado - de batismo Arioswaldo Pires, sobrinho de Cornélio Pires , apresentador do programa e também lendário divulgador da música sertaneja - disse que uma dupla tão original, com vozes gêmeas, não poderia ter nome espanhol. Batizou-os, na hora, de Tonico e Tinoco.

A divulgação nos programas da rádio transformava a dupla em sucesso imediato, fazendo surgir dezenas de convites para shows. A primeira apresentação dessas foi no cine Catumbi, em São Paulo, hoje transformado em uma casa de forró sertanejo. Depois rumaram para o interior, em excursões que demoravam uma, duas, às vezes, três semanas.

A dupla estreou em disco, na Continental, em 1944, com o cateretê "Em vez de me agradecê" (Capitão Furtado, Jaime Martins e Aimoré)e que foi lançada em 07/45). Na gravação de "Invés de me Agardecê" ocorreu um fato inusitado, pois eles a gravaram e em seguida, quando foram gravar o lado B do disco soltaram a voz tão alto, da forma como cantavam lá na roça e estouraram o microfone . Como o processo de gravação era algo muito caro, o disco saiu apenas com um lado, mas como punição a dupla precisou ficar seis meses fazendo aula de canto para educar a voz e voltar a gravar.

Apesar da popularidade o trabalho para dupla sertaneja era garantido, porém limitado aos circos somente. Felizmente nessa época apenas em São Paulo estavam baseados cerca de 200 circos que iam ao interior para apresentação dos ídolos sertanejos do rádio.

Em 1961 estréiam no Cinema com o filme “Lá no Meu Sertão” de Eduardo Llorente, filme baseado na vida e obra de Tonico e Tinoco. No final de 1960 a dupla recebera um golpe quase mortal, quando Tonico, tuberculoso desde 1940, precisou ser internado num hospital em Campos do Jordão/SP, cedendo lugar para o irmão Chiquinho tanto nos shows, quanto nos programas de rádio e gravações de discos. Tonico fez uma cirurgia e um tempo depois deixou o hospital com a certeza que não voltaria mais a cantar. Tinoco, através da Rádio Nacional onde faziam o programa, pediu para os fãs rezarem pela saúde de Tonico, o qual ficou curado, e voltou a cantar com mais força e beleza. Em devoção a Nossa Senhora Aparecida, a quem a dupla atribuiu sua cura, construíram na Vila Diva em São Paulo/SP uma capelinha que recebe romeiros e devotos até hoje.

Em 1972, já com um enorme prejuízo, filmam “Luar do Sertão” de Osvaldo de Oliveira e desistem da carreira de atores, após vários filmes. Quase faliram nessa incursão pelo cinema. Mazzaropi fazia sucesso e fortuna pois produzia, distribuía e fiscalizava seus filmes, já Tonico e Tinoco sem condições de ter um fiscal na porta de cada cinema onde seus filmes eram exibidos, foram passados para trás, arcando com um prejuízo imenso.

Em 1979, precisamente no dia 6 de junho, Tonico e Tinoco fazem o que nenhum caipira havia sonhado: apresentam-se no Teatro Municipal, em São Paulo, num show de três horas que reúne um público recorde de 2.500 pessoas. Da beira da tuia, celeiros centenários onde cantavam no passado, os irmãos Perez chegavam a um dos mais famosos teatros do mundo, que até então só abria suas portas para óperas, balés e concertos eruditos.

Em 1984 participam do filme“A Marvada Carne” de André Klotzel, como convidados especiais.

Em 1989 gravam “Mãe Natureza” (Tinoco/José Carlos). Nesse disco Tonico já se encontrava bastante debilitado mas continuava sua carreira maravilhosa.

Em 13 de agosto de 1994 Tonico (faleceu aos 77 anos) devido à uma queda na escada do prédio onde morava e a partir de então, sem arrefecer, Tinoco e passa a fazer dupla com seu filho Tinoquinho. A dupla Tonico e Tinoco completaria 59 anos de parceria no dia seguinte ao da morte de Tonico.


Resumo da vida artística da dupla Tonico e Tinoco:

* Quase 1000 gravações divididas em 83 discos de 78 rpm, 14 compactos Duplos, 09 Compactos Simples e 84 LP´s de 33 rpm. A era dos CD´s a dupla não acompanhou devido ao falecimento do Tonico em 1994, mas mesmo assim as gravadoras a que eles pertenceram já lançaram no mercado um total de 60 CD´s. Tonico e Tinoco venderam mais de cento e cinqüenta milhões de cópias, realizando cerca de 40.000 apresentações em toda a carreira.

* Participaram de sete filmes de longa metragem:

-"Lá no Meu Sertão", com direção de Eduardo Llorente, 1961.
- "Obrigado a Matar", com direção de Eduardo Llorente, 1965.
- "A Marca da Ferradura",com direção de Nelson Teixeira Mendes, 1969.
- "Os Três Justiceiros", com direção de Eduardo Llorente, 1971.
- "Luar do Sertão", com direção de Osvaldo de Oliveira, 1972.
- "O Menino Jornaleiro", com produção de Tonico e Tinoco, 1983, e
- "A Marvada Carne", com direção de André Klotzel, tendo Tonico e Tinoco
como convidados especiais, 1984.

* Durante 40 anos apresentaram-se em Circos e Teatros. Criaram uma Companhia Circense, com a qual percorreram todo o País. Em cada Circo realizavam três sessões por noite. São autores de muitas peças teatrais circenses, entre elas:

- Chico Mineiro, Tristeza do Jeca, Mão Criminosa, A Marca da Ferradura, Nós e o Destino, É Crime Não Saber Ler,Justiça Divina, Lar Infeliz, Mágoas de Palhaço, Tentação do Vício, Papai Noel Chorou, Último São João, As Madrastas Também Choram, Curitibanas, Morro do Girau, Cabocla, Velho Pai, Deus Tarda Mas Não Falha, Inocente Condenado, Nossa Mãe Honrarás, Última Confissão, Bolo de Amor, Vestido de Noiva.

* Trabalharam 50 anos em Rádio na seguinte ordem: Rádio Difusora, Rádio Tupi, Rádio Nacional (hoje Globo)e Rádio Bandeirantes. Realizaram um trabalho de utilidade pública durante muitos anos, pois o Rádio era o único meio de comunicação que atingia todo o País. Através de seus programas os ouvintes se comunicavam com parentes distantes.

* Participaram da primeira transmissão da Televisão Brasileira,no ano de 1950. Apresentaram o Programa Na Beira da Tuia nas seguintes emissoras - Bandeirantes(1983),e SBT(1988), Cultura (Viola, Minha Viola).

* Realizaram grandes eventos, como: A Grande Noite da Viola, no Maracanãzinho/Rio de Janeiro(1981), Teatro Municipal de São Paulo(1979), Semana Cultural Tonico e Tinoco no Centro Cultural de São Paulo(1988) e o Troféu Tonico e Tinoco (1992). No mesmo ano, realizaram um show em conjunto com Chitãozinho e Xororó na cidade de São Bernardo do Campo/SP, onde reuniram um público estimado pela Polícia Militar em 100.000 pessoas.

* Entre as inúmeras premiações destacamos: 04 Roquetes Pinto, Medalha Anchieta(Comenda da Cidade de São Paulo), Ordem do Trabalho (Ministro do Trabalho Almir Pazzianoto), Ordem do Mato Grosso (Comendador), Troféu Imprensa, 02 Prêmios Sharp de Música e o Prêmio Di Giorgio.

* O slogan "A Dupla Coração do Brasil", surgiu em 1951, quando o humorista Saracura resolveu batizá-los assim, pela interpretação de todos os ritmos regionais. 

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